Image Map

Sim, a tal Délia estava certa: Leonardo não seria demitido perto das festas de fim de ano, mas para o ano seguinte nada era garantido. Ele odiava pensar que teria que começar a procurar empregos, ele odiava o que a vida dele poderia se tornar. 
A rodoviária era enorme e ele não fazia ideia de onde ele se encontraria com Délia. Aliás, ele não sabia ao certo o que ele estava fazendo indo encontrar uma desconhecida na rodoviária. Uma estranha que emprestaria a ele um livro de Charles Dickens. Uma estranha que ele não tinha nem o número do celular. Como ele podia ser tão lerdo e não ter pego o número dela no final de semana? Eles ficaram duas horas e meia sentados juntos, marcaram de se encontrar no meio da semana, mas nenhum tinha sido genial o suficiente de pegar o número do telefone. Palmas para eles. 
Talvez o lugar onde eles desceram fosse um bom lugar. Ou até o ponto de ônibus que eles foram depois. Ou o onde eles tomaram refrigerante juntos por que viram que o ônibus ia demorar muito. Ele não sabia, o lugar era imenso e eles não haviam marcado um ponto de encontro. A vida de Leonardo estava definitivamente indo de mal a pior.
Quando estava próximo de desistir, ir para casa e se convencer que tudo aquilo tinha sido maluquice da sua cabeça pois fazia quase uma hora que ele estava lá e nada de ver Délia alguma, ele avista de longe uma moça baixinha de cabelos longos com belos cachos na ponta. Seus cabelos tinham a mesma cor de chocolate que os olhos de Délia no final de semana. Provavelmente não era Délia, mas valia a tentativa então Leonardo correu em direção da moça chegando perto o suficiente para toca-la no ombro.
-Délia?
-Leonardo! Olá! Eu estava procurando por você! Sabe o que eu percebi? Que nós nos esquecemos de marcar um ponto de encontro.
-Ou de trocar os números de telefone.
-Ah sim, isso também. Bem aqui está o livro. - disse ela tirando da sua grande bolsa laranja um livro velho de capa escura onde podia-se ler claramente 'Um Conto De Natal'.
-Nossa, ele livro é mais velho do que você com certeza.
-Era do meu avô.
-E você vai emprestar para um estranho qualquer que conheceu no ônibus?
-Eu confio em você Leonardo.
-Eu deveria me sentir lisonjeado?
-Um pouco - risos.
-Quando você quer que eu te devolva?
-Leve o tempo necessário. Juro. Não me importo. Mas acho que seria legal você lê-lo todo até o dia 25/12.
-Por que?
-Para fazer mais sentido, Scrooge.
-Por favor, pare de me chamar assim.
-Por que? É tão legal!
-É que eu não entendo por que me chama assim.
-Leia o livro e saberá.
-Isso é uma charada? Por que eu odeio charadas.
-A vida é uma enorme charada.
-Sabe o que eu odeio mais? Metáforas.
-Não seja tão chato.
-Eu não sou chato!
-Claro que é! Que tipo de pessoa legal não gosta de metáforas ou charadas?
-Eu.
-Eu tenho certeza que você é a única exceção. 
-E se eu for?
-Eu tenho certeza que é.
-Olha, eu estou morrendo de fome. Tem uma dezena de restaurantes aqui dentro, por que você não escolhe um e jantamos?
-Tipo um encontro Leonardo Scrooge?
-Não. Tipo duas pessoas adultas que estão com fome e não querem ir para a casa de barriga vazia. 
-Pizza?
-Pizza.


***
-Então Leonardo, por que publicidade e propaganda?
-Você quer saber por que escolhi o curso que escolhi?
-Isso.
-Eu acho o mundo que tem por trás fantástico. É uma combinação de esforços para fazer algo dar certo.
-Qual é sua parte favorita?
-Não tem. Gosto de todas igualmente.
-Até a parte em que seu chefe te manda com uma campanha natalina para uma empresa de um judeu?
-Não, essa não - risos - E você, por que arquitetura?
-Eu sempre gostei de montar casas no 'The Sims'.
-Você foi fazer arquitetura por causa do 'The Sims'?
-É um jogo muito legal. Você já jogou o três? E viu que está para lançar o quatro?
-Délia, você escolheu um curso por causa de um jogo de computador que você jogava na adolescência?
-Não seja bobo Leonardo, claro que não. Mas a ideia de construir casas sempre me fascinou.
-Aposto que sim.
-Qual é, não acredita?
-Não.
-Então aos seus olhos sou uma adolescente que escolheu sua carreira baseada em um jogo de computador?
-Isso.
-Você é um babaca.
-Perdão?!
-Ba-ba-ca. Simples. Olha só, você come pizza de muzzarela. 
-E você de marguerita. É quase a mesma coisa Délia.
-Eu sei, mas você é homem. Muzzarela é muito suave até para mim que sou mulher. Aliás, por que muzzarela?
-Eu não sei. É a minha favorita. E a única que eu sei fazer.
-Você cozinha?
-Pizza de muzzarela. - risos - E algumas outras coisas também. Minha mãe tinha um restaurante então passei a maior parte da adolescência ajudando-a. 
-O que aconteceu?
-Ela sofreu um acidente de carro e depois disso criou síndrome do pânico e não sai mais de casa. Meu pai vendeu o restaurante.
-Eu lamento - disse Délia dirigindo a mão em direção a dele que rapidamente recuou - por que recuou?
-Você não lamenta. Só disse isso por força do hábito. E a mão é um lance de pena. 
-E se não for?
-Eu tenho certeza que você é a única exceção - disse Leonardo fazendo um sorriso amarelo.
-Então que tal trocarmos nossos números? Sabe, para você me devolver o livro ou, sei lá, podemos fazer alguma coisa um dia desses.
-Não tem muitos amigos na cidade?
-Poucos.
-Sorte sua. Nunca morei em outro lugar mas parece que só conheço babacas - risos - Mas de qualquer forma, vou adorar fazer alguma coisa com você esses dias. 

Beijos
S.S Sarfati

Deixe um comentário